Famoso, o senhor? (Por Marco Antônio de Paula Franco)
Corria a década de cinqüenta. O futebol recheado de craques, as pessoas com outra cultura – época de caçar passarinhos de bodoque, nadar na lagoa, mesmo nos bairros que circundavam General Severiano, no Rio de Janeiro. “O Senhor me arruma uma boquinha?” Aquela pergunta fez o treinador do Botafogo, que ministrava o treino da sexta- feira, que antecedia o clássico contra o Flamengo, fazer cara de espanto. O interlocutor um rapaz magrinho, descalços, de pernas arcadas, tortas mesmo. “E então, me arruma?” Insistiu. “Você quer, no duro?”, perguntou o treinador. “Vou te arrumar quinze minutos, no final...” (...Uma ginga pra lá, outra pra cá. Uma ameaça, outra. Na sua frente o lendário, o maior lateral esquerdo do futebol brasileiro: Nilton Santos. Já foi Mané rumo a linha de fundo, Nilton ainda tropeça nas pernas bambas pela surpresa do drible, mais tarde descoberto imarcável...) _________________________________________________________ E lá estava o técnico, nervoso, pedindo marcação, insistindo na jogada ensaiada, mas o suficiente ligado para ouvir a mesma pergunta: E os meus quinze minutos, meu? Já deu! “Carlinhos! Carlinhos!” Berrava o treinador para o seu ponta- direita. “Vem cá, dá sua camisa e sua chuteira prá este rapaz, deixa ele treinar um pouco...” A bola ainda corria entre os atletas, quando o ponta-direita desconhecido já estava posicionado lá na outra beirada do campo. “Toca pro ponta, toca pro ponta!” Gritava o treinador com jeito de quem queria se vingar: “quem mandou querer entrar?” – pensava.
Os jogadores que só então pareciam notar a presença do menino do bairro carioca de Pau Grande, se deram conta de que poderia ser uma grande brincadeira. Uns ainda gritavam para o jogador que estava com a bola: “toca, toca, pro ponta...” Ela veio toda quadrada pelo toque maldoso do companheiro, Mané deu com a prancha do pé nela e a bola, como se conhecida de outras histórias, de outros tempos, repousou a sua frente, na relva molhada pelo sol das seis e meia, do mês de Junho, de frio, de um tempo que era permitido narrar detalhes que hoje parecem não ter sentido.
Uma ginga pra lá, outra pra cá. Uma ameaça, outra. Na sua frente o lendário, o maior lateral esquerdo do futebol brasileiro: Nilton Santos. Já foi Mané rumo a linha de fundo, Nilton ainda tropeça nas pernas bambas pela surpresa do drible, mais tarde descoberto imarcável... Na segunda bola para o ponteiro já não havia mais risos, mas olhares estupefatos. Incrédulos. Mané gingou da mesma forma, passou da mesma forma, como ele passaria a vida toda por todos os seus marcadores.
Na volta da jogada, um Nilton Santos nervoso pegou-lhe pelos braços e reclamou: “Você está louco moleque? Eu sou o Nilton Santos, sou famoso!” E o Garrincha, menino - anjo e menino -: “Famoso? O Sr. faz o quê?”
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